20.7.10

xamanismo e a sabedoria nativa americana


Nesta foto, ele segura o Cachimbo Sagrado. Está em prece. A cabeça do búfalo, no chão, indica que ele pode estar voltado para o norte, região guiada pela energia deste animal

Nessa nossa vida corrida, muitas vezes não temos tempo pra nada. Neste contexto (e também fora dele), o xamanismo nos leva ao retorno à raiz de nossas raízes. Xamanismo é integração.

O que significa isso?
Vou te fazer algumas perguntas:
Você alguma vez já reparou ou costuma reparar de onde vem a brisa do ar e qual é a temperatura dela quando chega até você?

O que o mar representa para você? Que sensações te traz?

Você já parou para refletir sobre a energia própria de cada animal? Não me refiro apenas a gatos e cachorros de estimação que, aliás, nos ensinam um bocado neste sentido, mas a TODOS os animais que cruzam o seu caminho, ou os seus sonhos...

Já se conectou à energia da cachoeira enquanto aquele jato d’água caía sobre a sua cabeça?

Já reparou que a luz do sol tocando nossa pele é muito mais do que apenas o contato físico? Falando nisso, quantas vezes nos damos conta do toque da luz solar em nosso corpo? E o que sentimos quando ela nos toca? Será que é paz? Será que é alegria? Ou será que é só calor?

E o inverno...ah, o inverno. A sabedoria dos índios norte americanos me ensinou que inverno, essa estação do ano tão mal falada por muitos de nós é, na verdade, a natureza agindo para nos incentivar à prática da introspecção. Ou você nunca reparou que, no inverno, tudo fica mais quieto e que nós mesmos nos tornamos mais introspectivos? Por que será que a natureza nos faz passar por isso, todos os anos?

Xamanismo é enxergar a vida além das aparências e com enormes lentes de aumento
Povos nativos americanos
Eles viviam o xamanismo, ou seja, estavam sempre integrados além da matéria com a natureza que os cercava e nos deixaram um legado incrível de tradições e costumes que, ao sobreviverem ao massacre de praticamente todo um povo nos possibilitam, hoje, a melhoria de nossa visão de mundo e de nossas atitudes. Vou dar alguns exemplos:

Na Cerimônia da Doação, nos ensinam que devemos doar nossos melhores objetos (e não os piores) porque, se é bom pra mim, também será bom para o outro. Olha o exemplo do desapego! O olhar em prece para o oeste, região com a energia do urso, nos ensina a importância do silêncio, pois a exemplo da hibernação deste animal, nós também precisamos hibernar em meditação no mais profundo de nós mesmos para encontrarmos as respostas que buscamos. O Cachimbo Sagrado era pitado apenas após uma oração a Wakan Tanka (Grande Mistério, Deus) e depois de uma oferenda: parte do tabaco que seria pitado era antes devolvido à terra, uma atitude simbólica de agradecimento àquela que possibilitou a existência do tabaco.

Já vivenciei alguns rituais do tipo. Minha primeira Tenda do Suor aconteceu em São Paulo, há cinco anos. Tive, também, a chance de participar deste ritual no meio dos próprios nativos americanos e de seus descendentes, quando estive nos Estados Unidos em 2008. Antes de entrar na Tenda, eu caminhei em silêncio em volta dela, partindo do leste – onde o sol nasce, a vida começa. O sul representa a adolescência. Depois caminhei pelo oeste, que é a região-símbolo dos grandes desafios da vida à nossa maturidade. Cheguei ao norte, região que representa a sabedoria dos mais velhos, consequência de uma vida bem aproveitada de leste a norte. O sentido é este: leste-sul-oeste-norte porque segue o fluxo da energia do universo, que se move da esquerda para a direita.

De volta ao leste e findo o ciclo, finalmente entrei na tenda. Dentro dela nossos pés ficam descalços. Um buraco no centro abriga pedras antes ardendo na fogueira do lado de fora. Ao serem banhadas com chás de ervas medicinais, sobe o vapor. A tenda vai ficando cada vez mais quente, enquanto participantes cantam canções sagradas. Aguentar o calor é devolver à terra um símbolo de gratidão pela bênção da vida que ganhamos, a cada dia, deste planeta. A energia dentro da tenda é tão forte que não vemos o tempo passar. Não sei quanto tempo fiquei naquele calor. Este ritual é para doar gratidão e amor à terra e aos que compartilham a tenda conosco. Doei, mas recebi muito mais. Difícil colocar em palavras.
*
Estes rituais têm sido retomados em inúmeros centros de xamanismo Brasil afora. Alguns com uso de ayahuasca, para aumentar a percepção.

Depois de participar de rituais xamânicos no Brasil e no exterior, a vida me brindou com alguns desafios, propondo-me à prática ainda mais profunda do que é o xamanismo.
Poucos dias antes do ano novo de 2009, dentro da floresta amazônica e em companhia de um amigo, eu caminhava por uma trilha munida com minha lanterna. No entanto, eu via o céu mais claro do que as copas das árvores. Um certo instinto, aquele que habita o mais profundo de nossos seres e que é a própria intuição, imediatamente se interpôs entre mim e a luz artificial.

Brotou a certeza de que, caminhando à noite pela mata amazônica, nada de errado me aconteceria pelo simples fato de eu considerar aquele lugar sagrado e reverenciá-lo. Por ter pedido licença para estar ali. Por ter sido avisada, pelos próprios espíritos da floresta através da voz do meu coração, que não haveria o que temer. A certeza tomou conta de mim ao ponto de eu simplesmente decidir caminhar no escuro, fato comemorado por este amigo, um dos seres mais integrados com a natureza que já conheci.

De repente eu sabia onde pisar. Meus pés sabiam onde não haveria aranha, nem cobra. Meu corpo sabia como se movimentar. Sabia onde tocar. Meus ouvidos aguçaram-se e passei a ver com o tímpano. Naquele momento, eu sabia caminhar sem fazer barulho. Em silêncio, prosseguimos por mais de 1 quilômetro.

Senti-me protegida pela floresta. Sobrevivi muito bem.
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Sobre o que falei a respeito dos animais, logo no começo do texto: repare bem nos animais que você mais gosta, quais aparecem em seus sonhos, quais chamam sua atenção, leia a respeito (dê um google em "animais de poder") e você saberá que são seus guias de cura. Todos nós temos a energia de pelo menos 7 animais que nos acompanham por toda a vida. Acredite se quiser. :)
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A conexão com a terra é necessária. Precisamos nos voltar mais para a natureza e para seus ensinamentos que vão além das palavras e da razão e que só podem ser aprendidos através da porta da intuição.

Clarissa Pinkola Estés, autora de Mulheres que Correm com os Lobos, escreveu o seguinte sobre si mesma: “Tive a sorte de crescer na natureza. Lá, os raios me falavam da morte repentina e da evanescência da vida. Tive aulas sobre a sagrada arte da autodecoração com borboletas pousadas no alto da minha cabeça. As lagartas cabeludas que caíam de seus galhos e voltavam a subir, arrastando-se, me ensinaram a determinação”. Isso é xamanismo na prática.

Agora que tal passar um sábado no campo, na praia, perto daquela árvore que você curte tanto? Essa é a primeira lição importante. Não se esqueça de manter o silêncio. Esta é a melhor maneira de integrar-se com a natureza em seu sentido mais profundo. Sinta-a, mantenha o silêncio e seja grato. Você sentirá sua voz sussurando sabedoria aos seus ouvidos...

Onde você vai chegar com isso? Nem o céu é o limite, meus amigos. Nem o céu é o limite.

Onde saber mais
Livros
Qualquer um da Jamie Sams. Gosto bastante do “As Cartas do Caminho Sagrado” e “Cartas Xamânicas”, Editora Rocco


Vídeos legais do youtube
Um chefe Hopi fala sobre esta desconexão com a terra e a necessidade de nos reconectarmos. “Changing is evolution”. Mudança é evolução. Em inglês.
Cherokee Morning Song, uma canção belíssima cantada 4 vezes, para as 4 direções, com imagens dos povos nativos americanos.
Coyote Tracks - Children of The Earth Foundation (Pegadas de Coiote - Fundação Crianças da Terra), coordenada pelo fundador da Tracker School. Vídeo inspirador. Em inglês.

Sites
Tracker School
http://www.trackerschool.com
Escola fundada por Tom Brown Jr. na onde ele transmite a seus alunos conhecimentos acumulados de 15 anos de intensa convivência com um sábio xamã Apache que, sozinho, percorreu as Américas. Na escola dele, você vive por uma semana como os povos nativos americanos viviam – e aprende de tudo - de fogo a filosofias e espiritualismo destes povos.


Sabedoria Nativa - matéria minha para a revista Vida Simples.
http://vidasimples.abril.com.br/edicoes/071/pe_no_chao/conteudo_305224.shtml

3 comentários:

preparador de polimeros disse...

Que texto mais lindo, amei!

Paulo disse...

Parabéns devemos mesmo mostrar as maravilhas e a cultura destes povos tão lindos..

Anônimo disse...

divorei tudo que escreveu..desde criança sentia -me atraida pelos Indios Nordamericanos e lia tudo sobre eles e chorava quando lia as maldades que os Brancos faziam com eles...tenho hoje 64 anos e os Indios Nordamericanos estão sempre no meu coração e tenho respeito por filosofia de vida e sabedoria deles