por André Lima
Deputado Aldo Rebello superou seu próprio discurso anti-ambiental. Quem achava que se tratava apenas de jogo de cena quebrou a cara. Em sessão concorrida da Comissão Especial do Código Florestal desta terça-feira, 08 de junho, apenas três dias após o Dia Internacional do Meio Ambiente, o deputado apresentou e leu parte do seu canhestro relatório. Em leitura enfadonha e desqualificando de forma autoritária as organizações e inclusive os técnicos da sociedade civil contrários ao seu posicionamento o Deputado Aldo ofereceu seu tão esperado relatório para praticamente revogar o Código Florestal brasileiro.
Citando de Malthus, a Luiz Gonzaga, o Deputado Aldo demonstrou grande sensibilidade para as teses mais arcaicas do ruralismo do século passado. Comprovou também que não tem nenhuma responsabilidade para com o patrimônio público (ambiental), o Estado de Direito e a Função Social da Terra, teses consagradas na nossa Constituição Federal e caras aos comunistas (neste caso- ex-comunista). Conseguiu (pasmem!) apresentar um relatório muito mais condescendente com os infratores ambientais do que o apresentado pelo Deputado Moacir Micheletto, há mais de 10 anos atrás, e que lhe rendeu o apelido de deputado Moto-serra cunhado por organizações não Governamentais participantes da Campanha SOS Florestas.
Sem maiores delongas, os aspectos mais graves da proposta de Código Florestal TOTAL-Flex de Aldo Rebello são:
1) Anistia geral e irrestrita a todo desmatamento ilegal ocorrido até julho de 2008 cancelando multas, suspendendo embargos e permitindo que ocupações ilegais recentes em Área de Preservação Permanente e Reserva Legal sejam beneficiadas com a manutenção das atividades até que o governo elabora plano de recuperação ambiental.
2) Inverte de forma inconstitucional a responsabilidade pela elaboração de planos de recuperação de áreas objeto de dano ambiental decorrente de crime ou infração atribuindo obrigações ao poder público para elaborar os Planos de Recuperação Ambiental.
3) Permite que os Estados possam reduzir em até 50% as dimensões das áreas de preservação permanente.
4) Revoga a exigência de Reserva legal para as propriedades com até quatro módulos rurais (ex.: 600 hectares na Amazônia), permitindo com isso mais desmatamentos em todos os biomas em todo País.
5) Concede mais 35 anos para a recomposição de RL (pelo Estado) quando esta for exigível. Os trinta anos começaram a contar em 2000, com a MP 2166, mas a proposta é de renovar esse prazo.
6) Abre a possibilidade, sem qualquer critério técnico previamente estabelecido, aos estados e até mesmo municípios de declararem empreendimentos como de utilidade pública para fins de desmatamento em qualquer categoria de área de preservação permanente.
7) Suspende todos os termos de compromissos e de ajustamento de conduta para cumprimento do código florestal já assinados entre produtores rurais e órgãos ambientais em todos os biomas do País.
Além do que foi acima descrito o Deputado Aldo ainda propõe em seu relatório:
A) Em rio com até 5 metros de largura (rios mais vulneráveis a poluição e erosão) a APP passa a ter limite máximo de 5 metros de APP (hoje essa margem é de 30 metros de largura). Com isso abre a possibilidade para novos desmatamentos.
B) A definição de APP em áreas de várzea passa a ser definida pelos estados pois deixa de ter um parâmetro geral federal.
C) No caso de ocupação de área com vegetação nativa entre 25-45° de declividade, que hoje é limitada, a competência para autorizar uso é retirada do órgão ambiental e é atribuída a um órgão de pesquisa agropecuária (não define qual).
D) Formações campestres amazônicas (campinarana, lavrados) passam a ter Reserva legal de 20% (até então aplicava-se a elas o percentual de 35% como cerrado).
E) Permite o cômputo total da APP na reserva legal, mesmo que estejam desmatadas (em processo de regeneração).
F) ZEE pode regularizar desmatamentos ilegais ocorridos até julho de 2008.
G) Permite recomposição de RL com espécies exóticas a critério do órgão estadual (deixa de exigir parâmetro do CONAMA).
H) Desonera empreendimento de interesse público em área rural no entorno de lagoa de ter Reserva Legal, sem definir o que sejam empreendimentos de interesse público (por exemplo condomínios privados podem ser declarados por prefeituras como de interesse público).
I) Permite a compensação financeira para regularização de reserva legal (a lógica do desmate, ocupe, lucre e pague).
J) A averbação de reserva legal deixa de ser obrigatória até que o poder público elabore o PRA.
k) Propõe a recomposição voluntária de Reserva Legal até que o Poder Público apresente o PRA.
L) Permite a consolidação de ocupação em áreas urbanas de risco (margem de rios, topos de morros e áreas com declividade).
Em seu discurso rococônico com citações desconexas que viajam forçadamente de Epicuro a Guimarães Rosa, o Deputado Aldo deixou claro e sem constrangimento que não entende nada e não tem nenhuma responsabilidade com o equilíbrio ambiental no Brasil. Defende o princípio da arrogância humana, que se coloca acima de tudo e de todas as demais espécies e que com sua razão tudo pode. Para ele o Brasil é sobretudo o celeiro do mundo e todos os que não se rendem a essa visão míope e parcial da realidade do país são por ele taxados de inimigos da nação. Infelizmente esse é o cenário que teremos que enfrentar no Congresso Nacional nos próximos dias. Até os ruralistas se surpreenderam com a sintonia entre o relatório de Aldo e suas demandas históricas.
Por isso amigos acompanhem, mandem mensagens e liguem para os seus deputados, e participem das Campanhas SOS Florestas: WWW.sosflorestas.com.br e Exterminadores do Futuro WWW.sosmatatlantica.org.br
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[1] Artigo escrito em 08 de junho de 2010 por André Lima, advogado, formado pela Universidade de São Paulo (1994), mestre em Gestão e Política Ambiental pela UnB, Coordenador de Políticas Públicas do IPAM e Diretor de Assuntos Parlamentares do Instituto O Direito por um Planeta Verde. Foi Coordenador Jurídico da SOS Mata Atlântica entre 1994 e 1997, Coordenador de Política e Direito Socioambiental do ISA entre 1997 e 2007 e Diretor de Políticas de Controle dos Desmatamentos no Ministério de Meio Ambiente entre 2007 e 2008.
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